terça-feira, 17 de maio de 2011

Neurótica

A luz está focada em duas cadeiras no meio do palco voltadas uma para outra. Na primeira está sentada uma mulher que aparenta estar impaciente. Entra em cena outra andando depressa em direção a cadeira vazia.

LUÍSA - (Sentando na cadeira) Desculpa, doutora, o ônibus atrasou.

PSICÓLOGA - Tudo bem... (Olha anotações em um caderno)Luísa, certo?

LUÍSA - Sim.

PSICÓLOGA - Então, Luísa, o que acontece?

LUÍSA - Bom, as pessoas dizem que eu sou neurótica.

PSICÓLOGA - Hum... E por que elas dizem isso?

LUÍSA - Porque eu sempre penso que minha menstruação vazou.

PSICÓLOGA - Sua... Menstruação... vazou. (Com a aparência de quem concorda em chamarem Luísa de neurótica)

LUÍSA – VASOU!? (Erguendo as mãos para o céu) Senhor, por que me abandonaste?

PSICÓLOGA – (Fica olhando incrédula por um tempo. Depois pisca e volta a falar) Não, não. Acalme-se, só estava organizando meus pensamentos.

LUÍSA – Ah (Aliviada). Nossa, quase que você me matava.

PSICÓLOGA – (Sussurra) É pior do que eu pensava... (Falando alto) Então, por que você pensa isso toda hora?

LUÍSA - É que é o seguinte doutora, eu acho isso uma nojeira e uma falta de cuidado absurda! Então toda vez que eu fico menstruada penso que vai acontecer comigo.

PSICÓLOGA – (Anotando no caderno) Como você age nesses dias?

Luísa levanta e vai em direção às cadeiras de sala de aula dispostas no outro lado do palco, onde a luz é focada. Um grupo de pessoas entra em cena e senta nas cadeiras.

LUÍSA - Nos dias que ela me visita toda vez que eu vou para a aula sento na cadeira (Senta), passo a aula inteira pensando no meu absorvente e quando é hora de ir embora levanto suando frio (Levanta) e olho para a cadeira para ver se tem alguma poça (Olha). Se vejo que sim cogito me matar ali mesmo. Se vejo que não, passo a mão na bunda (Passa) para ver se tem alguma coisa úmida ou suspeita, só para checar. Quando vou andando na rua (Sai da sala de aula e começa a andar pelo palco onde passam pessoas, como numa rua agitada) sinto que todos estão olhando para mim com pena, como se dissessem...

TODOS - Lú, vazou!

LUÍSA - Então só por segurança ando com um casaco para amarrar em minha cintura a qualquer momento. (Sorri e volta para a cadeira em frente à outra mulher)

PSICÓLOGA – (Embasbacada) Estou perplexa. (Respira fundo) Há mais alguma coisa que você queira me contar?

LUÍSA – Hum... Não... Ah, algumas vezes isso acontece quando eu não estou menstruada.

PSICÓLOGA – O quê!?

LUÍSA – Isso também acontece quando eu não estou menstruada.

PSICÓLOGA – (Levanta, anda de um lado para o outro com a mão na cabeça) É, querida... (Para e olha para Luísa) Temos um longo trabalho pela frente.

A luz apaga. As mulheres saem e tudo é retirado do palco. Apenas Luísa volta. Age como se estivesse saindo de casa.

LUÍSA – Tchau mãe, até mais tarde.

Um homem entra em cena, vê a mulher e vai na direção dela.

HOMEM – Lú! Como foi...

LUÍSA – (gritando) Nem vem que a minha menstruação desse mês já passou!

As cortinas se fecham.

terça-feira, 3 de maio de 2011

Paixãozinha démodé

Mariana, sempre azarada, amou um menino que a amou também. Repetiam um para o outro o que falavam todos os dias para o espelho, para a cadeira, para o computador, com a mesma importância. Era um “eu te amo” quase sincero muito valorizado.

“Eles combinam!”, as pessoas cochichavam baixo o suficiente para que o casal ainda pudesse ouvir. A menina e o menino sempre andavam juntos, se beijavam quando se viam e novamente quando se despediam - “Que fofos!”. Mariana mandava para o suposto amado textos românticos, copiados de agendas de amigas, parecidos com aqueles textos eternos e onipresentes. O namorado pagava sua entrada para o cinema. Eram perfeitos e comuns.

Um dia Mariana sentiu náuseas de ouvir aquela frase gasta (finalmente, Mariana!). Cogitou a possibilidade de terminar a relação, mas era tudo tão bem visto pelos outros. As aparências tinham que ser mantidas e o garoto concordava. Davam as mãos ao andarem na rua, em casa e até acompanhavam o outro até a porta do banheiro. Era afeto, cuidado e amor, acima de tudo o amor.

“Amor coisa nenhuma!”, disse a menina para seu namorado. Não aguentando mais a prisão optada os dois arrumaram um jeito de explicar a separação. Brigaram em público. A causa? Ciúmes, é claro. Há então motivo mais démodé? “É isso que dá amar demais, a pessoa fica possessiva, ciumento. Eram um casal tão bonito...”, comentavam.

É, meus caros, o sonhado que se concretiza é só uma farsa da realidade.

Laysa Menezes