Meu avô, já velhinho, vive de namorico com a senhora dona morte. Não há outro assunto que o interesse. Um dia eu e minha irmã fomos para a casa dele, visitá-lo, e ele estava na varanda, lendo um livro. O título: “Depois da morte”. Minha irmã, que cisma com essas ideias tenebrosas por parte dele, disse logo:
- Mas, vô! Por que ler um livro desses? Não tem outro?
- Claro, minha netinha. Por favor, pegue ali em cima da mesa “a morte de um estranho”.
Eu sorria discreta no meu cantinho. Observar um avô nunca foi tão divertido e cansativo. Cansativo, sim. Imagine escutar tantas vezes a palavra morte em um curto espaço de tempo!? Tentei convencê-lo de que iria viver muito ainda, mas o velho gosta do pessimismo.
Chamando o resto da família para a varanda, na tentativa de tornar a conversa mais diversificada, surgiu a curiosidade de saber quantos anos minha avó teria. Cada pessoa chutava um ano de nascimento, o qual ninguém acertava, nem seus filhos. Então, cansada de ouvir erros, ela falou:
- Nasci em 38!
E meu avô, dignamente respondeu:
- 38 é uma boa arma.
Ao se despedir de mim, para não perder o hábito, não deu a bênção de costume e sim um “Até o paraíso, minha netinha”. Ele ainda vive, ansioso para que a dama de voz tão convidativa se aproxime.
Laysa Menezes